Nas várias
ocasiões que conversei com os nossos vizinhos espanhóis sobre o que pensam de
nós portugueses, têm uma opinião quase unânime de que somos um povo triste e
excessivamente formal, poeticamente
falando, suavemente envolvidos pela melancolia do fado. Ademais fazem alarde
que são um povo alegre, festeiro e cercano.
Essa era
também a ideia que tinha, alentada também pelos canais nacionais espanhóis,
onde realmente se pode ver alegria, humor, beleza, comunicação, etc... No na
prática, as coisas não são bem como nos fazem imaginar.
Foi ao viver
algum tempo no seu meio que me deu a oportunidade de verificar que os espanhóis
são exactamente como nós portugueses. Há pessoas alegres, tristes, introvertidas,
comunicativas, imaginativas, ignorantes, formais, próximos, conflituosos,
isolados, desagradáveis, hospitaleiros, sociável, solitários, tudo, tudo igual
como nós!
Mas afinal
onde está a diferença?
- A diferença
está na força do conjunto como povo e na política da sua comunicação social.
Conhecendo os
espanhóis individualmente, em tudo parecem iguais a nós, mas em conjunto revelam
uma sinergia ímpar, que nós portugueses nem por sombras conseguimos. Ao longo
dos tempos estabeleceram tradições, convívios, festas, hábitos sociais que
tornam qualquer lugar acolhedor, surpreendendo positivamente qualquer visitante
desprevenido. Ok, ok, nós também temos disso, mas num grau substancialmente
mais baixo. Por essa e por outras estão atualmente a beneficiar de um turismo
apoteótico e que não pára de crescer…
Mas onde a
diferença é abismal (para mim quase chocante) é na comunicação social.
Indubitavelmente temos um comportamento excessivamente formal. Num primeiro
contacto tratamo-nos sempre por “você”, favorecendo o afastamento, custando-nos
depois estabelecer a necessária confiança e intimidade. A escrever…, bom a
escrever, somos desmesuradamente formais! Estou a escrever este texto e sinto
que estou a ser formal. Que vou eu fazer? Sou português! Em Espanha, é tudo
muito mais informal. Os palavrões e o calão soam bem; isso acaba por ajuda as
pessoas a comunicar de forma mais íntima e estimula as relações pessoais. Em
Portugal, isso soa a ofensivo, mal-educado e dá sensações de falta de cultura.
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Imagem típica da televisão portuguesa. Uma boca invertida significa "tristeza", não? |
Mas o pior de
tudo são os órgãos audiovisuais. Em Portugal, aquando da transição para a difusão
da TV digital - TDT, assistimos a um autêntico embuste e saque ao povo
português, quando em uníssono todos os canais, digo - RTP1,RTP2, SIC e TVI,
praticamente bloquearam a emissão livre e direccionaram todo o seu potencial
para os canais pagos. Paralelamente, temos assistido impávidos à selecção de
uma geração de profissionais da comunicação social, que é um autêntico
retrocesso e agressão ao espírito dos portugueses. Com as tristes esfinges mumificadas
que neste momento desfilam pela televisão portuguesa, o humor esfumou-se, a
formalidade tornou-se obrigatória e o acento do sul (Lisboa) impera. É aí que a
nossa imagem é mais lesada e ao mesmo tempo envolvem-nos de tristeza. Onde está
o humor dos anos 40 como o Pátio das Cantigas? Enterraram-no, essa cambada de
parasitas presumidos que ganham rios de dinheiro e ainda comprometem a nossa
cultura e o nosso espírito. Com toda a certeza que são parentes ou compadres
daqueles que fomentaram o polémico acordo
É nisto que os
espanhóis levam a nota máxima. Na transição para o TDT, investiram fortemente
na televisão pública, tendo cerca de 40 canais livres, entre nacionais e
autonómicos. Seleccionam os melhores profissionais tendo em conta as suas
apetências e qualificações. O humor, a cultura, a beleza, a atitude positiva, a
solidariedade, a preocupação pelo bem-estar e pela razão e pela justiça, são de
entre os muitos valores que diariamente são transmitidos ao povo espanhol.
E que é que
daí obtém? Obtêm um povo alegre, positivo, cheio de vontade de trabalhar, de se
divertir, de viver…
E nós? Parece
que nos condenaram condenados a sermos para sempre os “três tristes tigres”,
não por sermos tigres mas por sermos tristes, sem o sermos…